sábado, 29 de março de 2014

Mulheres centenárias relembram a vida no aniversário de Curitiba

Capital paranaense completa 321 anos.
Senhoras falam da felicidade de construir famílias felizes na capital.

Bibiana Dionísio Do G1 PR
Zaira Júlia Coelho Avelleda, de 102, foi a primeira professora do Colégio Júlia Wanderley, em Curitiba. (Foto: Bibiana Dionísio/ G1 )Zaira Júlia Coelho Avelleda, de 102, foi a primeira professora do Colégio Júlia Wanderley, em Curitiba
(Foto: Bibiana Dionísio/ G1 )
Comemorar 321 anos de Curitiba é também celebrar a história de quem nasceu na capital paranaense ou escolheu a cidade para viver. Algumas pessoas têm uma trajetória que corresponde a quase um terço da existência da capital paranaense. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Censo de 2010 indicou que 140 pessoas que resIdiam na cidade tinham mais de 100 anos. Para esses centenários, pensar Curitiba é relembrar a própria vida.

Com 102 anos, a ex-professora Zaira Júlia Coelho Avelleda fez parte da formação de muitos curitibanos. Ela foi a primeira professora do Colégio Estadual Júlia Wanderley, um dos mais tradicionais da cidade. Ainda na década de 40, quando havia apenas a estrutura física, uma portaria da Secretaria Estadual de Educação nomeou Isolda Schmidt como a nova diretora e Zaira Avelleda como a primeira docente da instituição de ensino.
A gente que nasceu e se criou aqui é como se fosse tudo da gente"
Zaira Avelleda, 102 anos
O tempo já compromete a audição, mas não a vaidade e as lembranças dos 32 anos de salas de aula. Ela conta que nasceu e construiu a vida em Curitiba. “É tudo da gente”. Para receber o G1, ela fez questão de arrumar o cabelo e pintar as unhas. Sempre com sorriso no rosto, ela se recorda da convivência com os alunos do colégio e também com os particulares, que iam até a casa dela. “Eu adorava, gostava muito. Lembro que sempre fui muito bem acolhida pelos alunos. Não posso dizer que um tivesse atrapalhado. É a maneira como a gente trata também. Da maneira como a gente faz, a gente recebe. Se trata bem, há aquela reciprocidade”.
Ainda que tenha trabalhado muito, dentro e fora de sala de aula, inclusive, com a gestão de uma chapelaria, Zaira não reclama da vida. São mais de 100 anos bem vividos. “Eu me sinto muito bem na vida, com os meus filhos... Eu sou feliz, minha família está sempre junto, sempre unida”. Zaira não deixa de citar Paulo, um poodle branco que vive com a família, e que fica agitado quando alguém se aproxima de Zaira. Hoje, ela tem dois filhos, três netos e dois bisnetos. A família planeja uma grande festa para 19 de maio, quando Zaira completa 103 anos.

Alice Antonieviczi  deixou a vida no interior de Santa Catarina para viver em Curitiba (Foto: Bibiana Dionísio/ G1)Alice Antonieviczi deixou a vida no interior de
Santa Catarina para viver em Curitiba
(Foto: Bibiana Dionísio/ G1)
Assim como a vida da ex-professora faz parte da história de Curitiba, outras trajetórias ajudaram a construir a cidade. Prestes a completar 101, Alice Pimentel Antonieviczi relembra como foi sair da vida rural, em São Bento do Sul, no interior de Santa Catarina, em busca de mais oportunidade. No caso de Alice, a família era grande – dez filhos. Qualquer decisão, qualquer mudança precisava ser bem pensada.  A vontade dos dois mais velhos, contudo, foi o impulso para a coragem.
Na bagagem, poucos objetos, porém, muita esperança de que tudo desse certo. “Eu tinha dois filhos mais velhos, que começaram a falar que não iriam ficar mais no sítio. Eles falavam para o pai que a gente não tem nada, não tinha roupa, não tinha calçado, que não podia comprar um terno. Falavam que iam embora para Curitiba. E o pai não queria vir, ele era do mato. Mas pensou: se os mais velhos forem para a cidade, o que nós fazemos? Com os pequenos não dá para ir para a roça, então, viemos, e acertamos”, lembra Alice.
Alice conta que nada foi fácil, mas que Curitiba deu a oportunidade de criar os filhos. Hoje, a família está ainda maior. Dos dez filhos, sete estão vivos. São 35 netos, 55 bisnetos e quatro tataranetos.

“Eu cheguei com vergonha com a minhas crianças. Uns bichinhos lá do mato, parecíamos uns passarinhos. Não tínhamos nem roupa para vestir. Foi triste, mas foi divertido. Todos trabalhavam. Nós fazíamos de tudo, o que surgia nós fazíamos. Eu cuidada de criança, lavava roupa para fora. Ele [o marido] fazia poço, fizemos cinco poço aqui na cidade. E os pequenos começaram a ir para aula. Os mais novos têm um pouco de escola”, lembrou orgulhosa.
No começo a gente ia ao Passeio Público, eu gostava der ver os bichinhos, porque no mato só tem cobra"
Alice  Antonieviczi, 101 anos
Os novos moradores despertaram a curiosidade das damas da cidade. “Eu quase morria de vergonha dos vizinhos. A gente era do mato, uns 'tabacudos' que não sabiam nem ler. A gente na manivela do poço, e aquela mulherada toda na janela só olhando. Meu velho trabalhava por 20 mil reis por dia. A gente tinha que dar de comer para os filhos. Mas a gente foi, caia aqui, levantava ali, e fomos indo”, contou.
É com um sorriso no rosto que ela se recorda dos poucos momentos de folga da família. O programa predileto era ir ao Passeio Público, no Centro da cidade. “No começo a gente ia ao Passeio Público, eu gostava der ver os bichinhos, porque no mato só tem cobra. Também a gente ia a missa, a igreja ou visitar a família. Não ia muito longe”.
O sentimento é de realização, de satisfação. Em Curitiba, Alice acredita que viveu o que tinha para viver. “Eu sou feliz porque criei todos os meus filhos, como eu fui criada. A educação foi como eu aprendi, com sofrimento. Eles também passaram por tudo. Fizeram os cantos deles, trabalharam, se aposentaram, agora estão todos bem de vida”.

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